quinta-feira, 31 de julho de 2014

Mini-férias

Este ano é o ano em que a minha mãe passa uma semana no Algarve, na zona do Carvoeiro. Apesar de não termos conseguido aproveitar os dias todos, conseguimos tirar três dias no meio da semana para umas mini-férias. Um aperitivo para as férias maiores do final de Agosto. Têm sido dias tranquilos, com manhãs cinzentas e temperaturas amenas, que dão lugar a tardes de sol e praia, descanso junto ao Atlântico. De todas as características deste local destaco a quantidade de praias. No meio da costa rochosa, de falésias e grutas, surgem as praias no fim dos vales. São praias mais pequenas que outras do Algarve, mais difíceis de alcançar, mas por isso mesmo mais singulares. São as praias que fazem os postais de uma das mais belas zonas do nosso país.

segunda-feira, 28 de julho de 2014

Vocação

É impossível tentar resumir os últimos dias que passaram. Desde o começo da gravação do disco até à participação no coro do baptizado do filho dos meus amigos, passando pela produção do espectáculo da Amor Fúria no Intendente. São dias completos e de muita gratidão por aquilo que recebi depois de ter oferecido o meu tempo e a minha vida àquilo que se vai tornando a minha vocação. Entender estas tarefas como vocação é meio caminho andado para tornar essa vocação uma forma de sustento de vida. Chegar a este momento praticamente sete anos depois de começar este caminho é como o amadurecimento do vinho nas pipas: está praticamente pronto a servir.

domingo, 20 de julho de 2014

Dia Cinco do Primavera

Para o fim ficou a descrição do último dia do festival, o mais curto de todos mas aquele que se revelou talvez o mais recompensador. Apesar do festival Primavera terminar os concertos no recinto principal no Sábado existem ainda concertos no dia seguinte, numa continuação de eventos que se estendem pela cidade. Começámos o dia de concertos nos jardins da Cidadela com os Boogarins. Os Boogarins praticam aquele róque psicadélico aparentemente retro, mas que tem muita vida e muito charme. As letras são de um português luminoso que caem bem sobre aquela manta de retalhos sónica. O sol brilhava alto, o calor aparecia e a aquele fim de tarde me pareceu bem bacano. Seguimos para o concerto das Dum Dum Girls, o segundo da banda no festival, o primeiro que vi, mas só até meio. As canções das Dum Dum Girls também são doces e dóceis, apesar de toda a pose róque. Há singles que se cantam baixinho no meio do calor, rodeados de gente, num espaço que foi pequeno para acolher tamanha romaria. Seguimos então para a porta do Barts, um espaço de concertos na zona da Parallel, um teatro com lugares limitados. Acabei por entender que teríamos sido demasiado cautelosos com a possibilidade de ficar à porta. Acabámos por ser os segundos da fila, que começou a formar-se cerca de uma hora antes das portas abrirem. Esta decisão fez com que ficássemos com os melhores lugares da sala, numa espécie de camarote com cadeiras individuais, onde conseguimos descansar e aproveitar os concertos naquela sala de uma forma privilegiada. O alinhamento da noite seria iniciado com Joana Serrat. Um concerto de aquecimento do ambiente desta cantautora catalã que apresentou canções de inspiração folque cantadas com recurso a uma só guitarra acústica, a maior parte cantadas em inglês. Seguiu-se Grouper. O concerto de Grouper já captou a nossa atenção de outra forma. A partir de sons gravados em cassetes, Grouper construía o chão de canções baseadas posteriormente em teclados e na sua voz. O que se escutou foi onírico e encantatório. As canções fluíam de forma lenta, em formato drone ambiental, a voz a repetir a melodia e imagens ampliadas a surgir da natureza que nos rodeia. A profundidade e a repetição com pequenas variações foi avançando ao longo do concerto em vários temas, de várias formas. Até terminar repentinamente com o fim de uma das canções e fuga da artista do palco, sem se dirigir por uma única vez ao público. A terceira do alinhamento do teatro Barts foi Juana Molina. Terá sido o concerto mais desinteressante do dia, mas o público adorou. Não ficámos rendidos àquelas canções de base electrónica e tradicional cantadas em espanhol. Chegava finalmente a hora do concerto de Angel Olsen. Terá sido também por ela que fomos a Barcelona e não nos arrependemos. As canções da Angel Olsen são cruas, mas completas. São épicas, mas simples. São claras, mas tristes. Há naquelas canções e na sua interpretação uma seta que acerta no coração, que arde de sentimento e bate forte com a cadência e o perigo do ritmo. As primeiras canções são apresentadas em banda e as últimas já a solo. Foi interessante ver a mudança no público da sala, que primeiro conversava ao longo das canções para no fim assistir em silêncio sepulcral à interpretação a solo. Angel Olsen tem naquela voz, nas letras e nas melodias, tudo o que importa. A gravidade, o talento e uma enorme disponibilidade. O resultado foi um concerto tão frágil quanto forte. Fortíssimo mesmo. Possivelmente nunca mais a veremos assim. A pele eriçada no fim das canções não mente, as lágrimas também não, foi um momento memorável. O momento em que saímos sem palavras de um espectáculo que nos relembra a razão para gostarmos tanto de canções e de gente que as cria e as interpreta. Assistimos certamente ao melhor concerto do festival nessa noite. O último e derradeiro concerto de um festival excessivo e exaustivo, do qual levamos memórias inesquecíveis.

terça-feira, 15 de julho de 2014

Ecografia

Foi durante a ecografia que tudo começou a mudar. Aquilo que foi sonhado e preparado está finalmente a acontecer. É o verdadeiro milagre da vida, uma altura da nossa vida em que somos ainda um feto, e já temos coração, cabeça, membros, tudo aquilo que nos forma até à nossa morte. O milagre começa antes, como todos aprendemos nas aulas de ciências, na fecundação. Mas é naquele momento, em que uma imagem aparece no ecrã do pequeno consultório médico, que tudo começa a tornar-se real. A partir desse ponto já só queremos que tudo corra bem, porque ainda há tantas fases e tanto tempo para o feto, que já foi embrião, tornar-se um recém-nascido. A ecografia é uma fotografia da esperança no futuro.

terça-feira, 8 de julho de 2014

Dia Quatro do Primavera

O nosso quarto dia do festival começou com um almoço no bairro de Sants. Depois do almoço regressámos ao Parque da Cidadela para assistir ao último concerto da tarde, The Twilight Sad. Quando chegámos o concerto já tinha começado. Apresentado num formato mais acústico, existiu um espírito de comunhão grande entre a banda e o público, e muita emoção por parte do vocalista escocês. Mas não foi um concerto memorável. Depois dirigi-me para o recinto do festival de autocarro. Quando cheguei ainda apanhei o final do concerto de Univers, uma banda de Barcelona. O dia começou verdadeiramente com o concerto de Islands. Uma boa pópe feita de guitarras de acordes fáceis, voz e arranjos a condizer. Saí dali com um bom sorriso. De seguida, e já novamente acompanhado, regressei aos palcos principais para mais um dos momentos aguardados do festival, concerto álbum dos Television. O concerto não superou a expectativa que era alta. A falta de rodagem em palco notou-se nalguma falta de garra. No entanto a mestria técnica continua toda lá. A banda regressou a um disco que descobri na altura em que comecei a ouvir todos os discos clássicos da história do róque. Foi bom e inesperado ouvir o Marquee Moon ao vivo. Nesta altura a minha mulher assistia às Dum Dum Girls. Pelo meio ouvi duas canções do Caetano Veloso ao som de um brinde aos aniversários e à nossa vida. Reencontrámo-nos para o primeiro concerto de Hip-Hop do dia, Earl Sweatshirt. O concerto começou com a apresentação de algumas malhas por parte do DJ e passados dez minutos surgiu o MC. Gostámos muito do concerto, pela presença do Earl Sweatshirt, apenas acompanhado pelo DJ, que fazia as segundas vozes nas estrofes mais fortes. Batidas sujas e inventivas, uma fluência irrepreensível, praticamente tudo o que se espera de um rapper na flor da idade e já é grande. Segui para o palco ao lado onde começava o concerto de Connan Mockasin. O artista surge mascarado de velhinha em palco, com uma banda a tocar o róque suave das suas canções. A estética das canções não é fácil para um concerto de festival e aquilo que em disco soa muito bem, soou ainda mais sossegado em palco. Não foi fácil por isso estar ligado ao concerto no meio de um público que ia dispersando à medida que as canções iam sendo apresentadas. Acabámos por descansar um pouco nas escadas e passados alguns minutos começamos a caminhada até ao palco do lado oposto onde ia começar Kendrick Lamar. É incrível ver um concerto de Kendrick no meio de milhares de pessoas que sabem literalmente todas as rimas de cor. Foi um concerto curto mas muitíssimo eficaz, com uma banda óptima a tocar ao vivo a maior parte dos instrumentais, baseado nos êxitos do disco good kid, m.A.A.d city. Um concerto intenso com momentos épicos e de comunhão. Com a plateia na mão o concerto acabou, devia ter continuado para sempre. Já posso acrescentar mais um concerto de Hip-Hop ao meu quinhão, que é demasiado curto também. Houve apesar de tudo uma vantagem na duração do concerto, deu a possibilidade de chegar ao concerto de Cloud Nothings e apanhar metade do concerto. Os nossos corpos abanaram ao som daquela descarga eléctrica de canções tão boas e tão desesperadas. O nosso coração foi um só e meio concerto de Cloud Nothings valeu por um concerto inteiro. Ainda cheguei ao mosh pit e segurei gente que voava sobre mim. No fim o desvario de barulho que durou dez minutos e mais um sorriso grande no fim de um concerto. Se o festival tivesse terminado assim seria maravilhoso. Mas ainda faltavam algumas horas para o fim. Foi nesta altura que passei a ver meios concertos até ao último concerto do dia do festival naquele recinto. Blood Orange, que parecia estar bom mas foi um concerto que passei ao lado por falta de discernimento e concentração, vi muitas raparigas a dançar. Mogwai, concerto perfeito para me deitar no relvado e observar as estrelas e as luzes do concerto de NIN ao longe. Ty Segall, já não havia energia e vontade para furar aquele compacto de gente que que vibrava ao som da rapidez do ritmo da bateria imparável e da eficácia dos acordes daquelas guitarras. Foals, concerto de refrãos para trautear, de canções em que se marcava o ritmo com a batida do pé e muita gente a dançar os temas radiofónicos da banda. Foi assim que se passou o tempo até ao último concerto do dia, que pertenceu aos Cut Copy. Um fim de festa próximo da perfeição. Depois de descansar nos concertos anteriores, recarreguei as baterias para dançar as canções da banda australiana. Dos temas mais antigos aos mais recentes. Libertar a mente, pensar no presente e aproveitar aquele momento que fica parado naquele instante. Não escolheria outra forma de terminar os dias principais do festival. Uma discoteca a céu aberto e uma plateia inteira a dançar.

quarta-feira, 2 de julho de 2014

Dia Três do Primavera

O terceiro dia do festival começou com a deslocação ao Parque da Cidadela para ver os concertos ao início da tarde. Após uma grande volta ao parque comecei a ouvir o teste de som e descobri o sítio dos concertos. Assistimos aos concertos de La Sera e de Magical Cloudz. O primeiro concerto decorreu sempre sob a ameaça da chuva que acabou por não cair de forma a cancelar o concerto, o palco era ao ar livre. La Sera é a banda de uma dos elementos das extintas Vivian Girls, e as suas canções seguem a mesma linha sónica, de melodias cantaroláveis e refrãos que são fáceis, tudo em baixa fidelidade. Acabei por comprar um CD directamente à banda para mais tarde recordar a alegria do concerto sob um céu cinzento. Já Magical Cloudz foi um concerto bastante mais tenso. Com a presença de apenas batidas, sons de um teclado e voz baritonal do vocalista principal, este duo canadiano trouxe consigo uma negritude que até aqui não se tinha ouvido no festival. Foi um dos concertos mais enigmáticos, talvez pela mistura entre esta tensão presente em todas as canções aliada a uma simplicidade desarmante na construção das canções. Segui depois para o recinto principal do festival. Cheguei a tempo do início do concerto de Mas Ysa, o concerto de Linda Perhacs tinha sido cancelado. Mas Ysa é um só e apresenta canções em forma de sequências que não terminam à qual vai acrescentando elementos mais elementos, na boa tradição de alguma da melhor electrónica do início deste século. Um concerto que assisti bem em frente ao palco, seríamos duas centenas de pessoas no máximo. Concerto solar de sons muito claros e canções fractais, por vezes cantadas, outras vezes não. Para ir descobrindo ao longo dos próximos tempos. Depois dirigi-me para um dos palcos principais, não sabia bem o que ia ver a seguir. Quando cheguei a chuva começou a cair ininterruptamente já depois do início do concerto de John Grant. Como o concerto não me estava a parecer nada de especial resolvi abrigar-me junto à entrada do recinto do festival bem longe da zona destes palcos. Foi nesta altura, após esta carga de água, que surgiram os arcos-íris documentados em todas as fotografias de reportagem deste ano do festival. Eu apenas consegui apanhar um com a lente do meu telemóvel. Quando a chuva começou a parar começou o concerto de Loop logo ali no palco ao lado. Acabei por não ver até ao fim, não estive muito focado nos concertos do revivalismo das bandas dos finais dos anos oitenta e início dos noventa, que se juntaram para este festival e as canções dos Loop pareceram-me quase indistintas, e claro que estou a ser injusto para a banda e para o movimento de guitarras inglesas que repetem os acordes até à eternidade com recurso a pedais e mais pedais, só que não estive nessa onda. Regressado ao espaço dos palcos principais reencontrei-me com a minha mulher, que tinha ido descansar ao hotel, para assistir ao concerto das Haim. Como classificar o concerto delas? Agridoce, será a palavra mais acertada. Foi um concerto que misturou momentos tranquilos e mais redondos, com outros mais agitados a demonstrar uma banda mais agressiva do que se pensaria depois de ouvir o disco. Preferimos as canções como estão gravadas aos longos momentos de improviso a que assistimos em concerto. Seguimos depois para o concerto de FKA Twigs. Apresentou-se em palco com três músicos que emitiam as batidas lentas, toda a produção R&B da escola inglesa pós-dubstep, pós-trip-hop, pós-tudo. E sobre isto a voz angelical da FKA. Foi um concerto em crescendo, já que no fim a voz estava mais solta e mais confiante. Dava a nítida sensação que estava a actuar pela primeira para um público tão dilatado, mas isso não a intimidou. Antes pelo contrário, do meio das suas danças meio orientais, surgiam temas que agarraram a plateia do início ao fim do concerto. Levou uma grande ovação. Depois do concerto, e uma vez que tinha decidido deixar o concerto de The War on Drugs para Lisboa, decidimos ir jantar e acabámos no meio do concerto de Pixies. Não direi que terá sido a melhor decisão. Assistir hoje a um concerto de Pixies é recordar os concertos de regresso da banda em que nada mais parecia importar que cantar todas as canções clássicas que tornaram os Pixies uma referência. Naquele momento foi apenas entediante. Já um pouco diferente foi assistir ao concerto dos The National. Confesso que fiquei com algum receio de assistir a mais um momento de celebração quase sem sentido por parte do público, tal como num concerto na Aula Magna há uns anos atrás. Ao invés assisti a um bom concerto da banda. Com uma produção vídeo muito cuidada e com os temas a serem perfilados de uma forma consistente por uma banda adulta, que ora acelera o ritmo numa canção mais veloz, ora desacelera para uma quase-balada, de canções com valor. O vocalista, já se sabe, é dado à dramatização, deixa cair muitas vezes o microfone no chão, invade o público e ofende os colegas de banda. Tudo faz parte da encenação e do espectáculo. Fiquei quase fã. Para o fim e também porque iria ver SBTRKT em Lisboa, optámos por assistir ao concerto de !!!. O concerto foi mediano, já que as novas canções da banda ficam muito aquém dos primeiros discos. Valeu pelo tema "Me and Giuliani Down by the Schoolyard" e pouco mais. No fim da noite sentámo-nos no anfiteatro do palco Ray-Ban, porque o cansaço acumulado já era bastante, para assistir ao último concerto do dia, Jagwar Ma. Seria o concerto indicado se ainda existissem energias para absorver todo aquele psicadelismo electrónico do fim dos anos oitenta vindo de Inglaterra da cidade de Manchester, que parecia estar a ser bom, mas este festival não seria mesmo dedicado a esse revivalismo, estava visto.